DANO
AMBIENTAL
E
CONSEQUENTE
RESPONSABILIDADE AMBIENTAL
Trabalho
realizado por:
Francisca
Vieira
4º
Ano Subturma: 7
Nº
18138
Introdução:
No
Século XX a sociedade começa a se consciencializar sobre o problema
ambiental e todas as questões que este suscita. Ao lado dos danos
patrimoniais e não patrimoniais previstos no Código Civil,
surge-nos o dano ambiental, como lesão ambiental susceptível de ser
reparado mediante diversas medidas.
A
génese deste novo instituto é em vários aspectos verdadeiramente
inovadora no mundo jurídico. Desde logo pela sua abrangência,
fugindo às balizas da responsabilidade voluntária ou subjectiva
tradicional no domínio das fontes das obrigações. Mas também pela
forma como foi assentando raízes e criando o seu próprio caminho.
Embora
a regulação do Direito do Ambiente tenha surgido em primeira mão a
nível internacional, aos poucos influenciou os diversos Estados,
demonstrando a necessidade de tomar medidas preventivas de tutela
ambiental e ainda medidas reparatórias dos danos ambientais, ou em
último caso ressarcitórias. A Administração Publica que nos
primórdios se considerava "dona do ambiente", assume agora
com uma função protectora e fiscalizadora deste bem jurídico. O
ambiente surge-nos assim por um lado como um direito subjectivo dos
sujeitos individualmente considerados, e, por outro lado, como um bem
jurídico dotado de valor imanente, carecido de tutela pública.
Os
recursos naturais são finitos e esgotáveis. Daí que a sua
preservação é essencial para a sustentabilidade das gerações
futuras, o que implica uma também necessária utilização da
natureza de forma racional e controlada ao contrário do que foi
feito durante longos anos. Urge responsabilizar aqueles que provocam
danos ambientais e prejuízos no meio ambiente, muitas vezes
irreversíveis.
Com
este trabalho pretendo demonstrar a relevância e o modo como se pode
responsabilizar a administração e as entidades privadas pelo "mau
uso" do ambiente.
Sumário:
1
Evolução Histórica
2.
Considerações sobre responsabilidade civil
3.
Princípios relacionados com a Responsabilidade Ambiental
3.1
Princípio da Prevenção
3.2
Princípio do Poluidor-Pagador
4.
Dano Ambiental
4.1
Dano Ambiental vs. Dano Ecológico
4.2
Reparação do Dano
5.
Responsabilidade Ambiental
5.1
Responsabilidade na Lei da Bases do Ambiente
5.2
Responsabilidade no DL 147/2008
5.3
Responsabilidade no Código Civil
5.4
Responsabilidade na Lei da Acção Popular
5.5
Responsabilidade subjectiva
5.6
Pluralidade de Responsáveis
5.7
Natureza jurídico-publica vs natureza jurídico-privada
5.8
Responsabilidade Objectiva
5.9
Responsabilidade por fatos lícitos
1.
Evolução História
Só
no século XX, nomeadamente nos anos 60 é que podemos afirmar que as
questões políticas do Ambiente são autonomizáveis e começamos a
poder falar de um Direito do Ambiente. Até a data as preocupações
ambientais tinham que ver com uma dimensão pré-politica: um amor á
natureza num quadro filosófico, muitas vezes de cunho religioso,
falando-se assim de um estado de natureza anterior á própria
sociedade, sendo a politica praticamente independente e alheia às
questões de preservação da natureza.
As
questões ambientais surgem inicialmente na escola internacional,
alertando os diversos Estados para a sua importância. Nos anos 60,
face a crise do Estado-providência, surgem os partidos verdes de
contestação, oposição e revolução. Estes partidos pecam pelo
extremismo e radicalismo em que colocam a questão do ambiente como
respostas para todos os problemas políticos da sociedade. A verdade
porém é que por sua influência ou reacção, as diversas correntes
políticas vão absorvendo e abraçando a questão ambiental que se
tornou rapidamente transversal. Mais tarde, podemos comprovar, a
preocupação ambiental torna-se uma constante dos vários partidos.
Com
a crise do petróleo, nos anos 70, revelou a instabilidade dos
recursos naturais e com ela a necessidade em estabelecer uma relação
equilibrada com a natureza.
Cresce
a consciencialização da necessidade de criar políticas ambientais
e organismos ambientais internacionais, de forma a preservar a
sustentabilidade dos recursos para as gerações futuras. Alguma
doutrina fala mesmo no Estado pós-social em que o ambiente se torna
assim um bem jurídico, e onde surgem os direitos ambientais (os
chamados direitos de 3º geração).
Estes
direitos ambientais, ou, como diz o Prof VASCO PEREIRA DA SILVA, os
direitos verdes, recebem da ordem jurídica uma dupla resposta: por
um lado são direitos subjectivos, direitos das pessoas, direitos
fundamentais; e por outro são também verdadeiros valores e bens
jurídicos de dimensão objectiva carecendo de protecção pelas
autoridades legislativas, administrativas, judicias e privadas.
Quando falamos em direitos das gerações futuras referimo-nos
aqui a esse sentido objectivo, pois são posições tuteláveis pelo
Direito mas onde ainda não existem entes subjectivos deles
titulares, não havendo direitos concretamente atribuídos. Surge
assim uma lógica de integração que o Prof VASCO PEREIRA DA SILVA
intitula de “Antropocentrismo ecológico”.
O
aparecimento destas novas preocupações ambientais e dos respectivos
direitos ambientais não fez desaparecer os direitos anteriores nem
os pretendeu substituir, constituindo antes estádios sucessivos de
aprofundamento e desenvolvimento dos Direitos do Homem. Por outro
lado não fez com que o Estado tivesse deixado de desempenhar a sua
função prestadora, nesta matéria, colocando-o num nível de
funções diferentes de caracter preventivo.
Como
pilar fundamental de qualquer disposição normativa, da definição
de políticas, ou da actuação do Poder Publico ou até dos privados
em matéria do ambiente, surge o princípio da sustentabilidade. O
conceito de desenvolvimento sustentável, antes integrado nas
políticas económicas mediante a ideologia de que o desenvolvimento
de um Estado passava pela economia e pela melhoria do nível de vida
das populações, foi posteriormente alterado para uma vertente mais
ambiental. O desenvolvimento que se almeja não deve pôr em perigo
esse bem ecológico fundamental que assegura a sustentabilidade dos
recursos hoje e para as gerações vindouras. A nível internacional
celebram-se várias convenções, e o conceito ressurge na década de
80 pela União Internacional pela Conservação da Natureza e dos
Recursos Naturais. O Relatório de Brundtland vem definir
desenvolvimento sustentável como o desenvolvimento que satisfaz as
necessidades presentes sem comprometer as necessidades das gerações
futuras.
Este
principio de desenvolvimento sustentável tem hoje consagração na
nossa Constituição no artigo 66º nº 2 alínea b). Preceitua-se um
direito ao ambiente como direito fundamental, incumbindo o Estado
“para assegurar o direito ao ambiente, no quadro de um
desenvolvimento sustentável, por meio de organismos próprios e com
o envolvimento e a participação dos cidadãos”, a promoção do
aproveitamento racional dos recursos naturais, salvaguardando a sua
capacidade de renovação e a estabilidade ecológica, com respeito
pelo princípio da solidariedade entre gerações. Esse dever do
Estado importa a necessidade de protecção jurídica subjectiva
contra agressões ilegais, públicas e privadas, na esfera
individual. Assim uma decisão que provoque danos ao meio ambiente,
pode estar ferida de inconstitucionalidade.
De
tudo isto resulta a necessidade de estimular a comunidade política,
social e mesmo a jurídica, para um sistema mais sustentável com a
necessidade de proteger o meio ambiente. Nesta linha, a nossa
Constituição no seu artigo 9º alíneas d) e) refere-se à defesa
da natureza e do ambiente como tarefa fundamental do Estado.
2.
Considerações sobre responsabilidade civil
Tradicionalmente
o Direito encara a as consequências dos danos no instituto da
responsabilidade civil. Historicamente, nos primórdios das
instituições jurídicas o direito de vingança que a consciência
colectiva reconhecia à vitima para simultaneamente punir o agressor
e reparar o dano, foi dando lugar a uma crescente admissão dos
sucedâneos pecuniários e à intervenção da autoridade pública
evitando as desordens que a acção privada normalmente ocasionava. A
separação entre a responsabilidade publica (normalmente de natureza
criminal) e a responsabilidade civil foi um avanço histórico e
civilizacional reconhecido hoje em praticamente todo o mundo
jurídico.
Curiosamente
porém a separação estanque que as doutrinas clássicas fizeram
verter entre o que é publico e o que é privado na reparação do
dano nos ordenamentos jurídicos foi dando lugar no último século a
uma certa incerteza e insegurança de fronteiras. O direito moderno
face à relevância crescente atribuída ao interesse da
colectividade foi superando esses anteriores dogmas do individualismo
e em especial no domínio da responsabilidade civil. O instituto
foi-se desviando do subjectivismo para as concepções mais
objectivas, atenuando ou dispensando a culpa como pressuposto para
que haja responsabilidade pela reparação do dano. No Mundo
contemporâneo, fortemente industrializado, tecnológico e
sofisticado, o desenvolvimento das potencialidades e dos modos de
actuação das pessoas, multiplicou os riscos e diluiu a
subjectividade anteriormente tão essencial à assunção de deveres
deste género.
Encontramos
é certo a responsabilidade tradicional, clássica ou subjectiva,
onde se exige:
- Um facto voluntário (acção ou omissão)
- Ilícito (violação de direitos subjectivos ou normas de protecção) e
- Culposo
- Um Dano
- E um nexo de causalidade entre aquele facto e este dano
Mas
ao seu lado foram surgindo crescentes exigências de uma
responsabilidade independentemente da culpa, muitas vezes associada
ao risco da actividade que se desenvolve ou dos meios com que se
opera. Chega-se mesmo a colocar a possibilidade de uma
responsabilidade por actos lícitos, tanta é a necessidade de
preservar determinados valores que o Estado social elege como
primordiais na sua organização. Paralelamente assiste-se à
socialização do risco, imputando genericamente às instituições
públicas (com ou sem direito de regresso) a primeira
responsabilidade por determinados danos.
Acresce
que à medida que a vida moderna tem alcançado determinados êxitos
científicos e tecnológicos ou enfatizado certas actividades ou
profissões susceptíveis de causar danos a terceiros, põem-se aos
sistemas jurídicos problemas de responsabilidade civil, centrados
agora no domínio da prevenção, da avaliação, do licenciamento ou
da autorização atingindo crescentemente o Estado no seu papel de
regulador e de disciplinador da actividade humana.
Mas
será que o instituto, hoje com muitas destas novas vertentes
disciplinadas no Código Civil é suficiente para atender à
responsabilidade ambiental que a Constituição elegeu como tarefa
fundamental do Estado e ao ambiente como direito fundamental?
3.
Princípios relacionados com a responsabilidade ambiental
3.1
Princípio da Prevenção
Com
a consciencialização da escassez dos recursos naturais e da
necessidade da sua preservação para a sustentabilidade da vida das
gerações futuras surge-nos o princípio da prevenção. O princípio
da prevenção é um dos princípios fulcrais do Direito do Ambiente,
embora não exclusivo deste ramo. Está consagrado no artigo 66º n.º
2 alínea a) da CRP e no artigo 3º da Lei de Bases Ambiental, tendo
por objectivo evitar lesões ao meio ambiente, prevenindo e
antecipando situações potencialmente perigosas. Como diria o senso
comum “mais vale prevenir do que remediar” daí a necessidade do
recurso a estes juízos de prognose de maneira para impedir a
degradação ambiental mediante mecanismos previstos em lei ordinária
para defesa do meio ambiente.
Estes
mecanismos são nomeadamente as licenças administrativas ou as
avaliações de impacto ambiental.
Este
princípio deve ser adoptado de duas formas: em sentido amplo
pretendendo-se afastar eventuais riscos futuros, mesmo que ainda não
determináveis, de acordo com uma lógica mediatista e prospectiva,
de antecipação de acontecimentos futuros; e em sentido restrito
procurando evitar perigos imediatos e concretos de acordo com uma
lógica imediatista e actualista. Como considera o Prof VASCO PEREIRA
DA SILVA o conceito mais amplo deste princípio abarcando tanto
lesões ambientais como riscos humanos, é o que hoje enferma a
responsabilidade ambiental.
Em
muitas situações, é muito difícil, na responsabilidade ambiental,
estabelecermos o nexo de causalidade entre um determinado facto e um
dano ambiental, daí que devamos aceitar que o Direito do Ambiente
presuma a causalidade quando haja alguém a quem possa ser imputada
determinada actividade que esteja em condições de ter causado dano,
ou pelo menos, que flexibilize os critérios de determinação desse
nexo causal.
Este
domínio da responsabilidade ambiental, com presunções de
causalidade, vai muito para além do instituto da responsabilidade
civil entendido pelo menos de forma tradicional
3.2
Principio do Poluidor Pagador
Este
princípio está presente no direito internacional, pela Recomendação
C (72) 128 de 26 de Maio de 1972 da OCDE, no direito comunitário,
pela Recomendação do Conselho nº75/436 de 3 de Março e no TUE
artigo 174º n. 2, e no direito interno português, pelo artigo 66º
n.º 2 da CRP. Surge como uma imposição ao Estado com vista a
assegurar que a política fiscal compatibilize o desenvolvimento com
o ambiente e a qualidade de vida. O princípio do poluidor pagador
tem essencialmente quatro funções: função de integração
económica, função redistributiva, função preventiva e função
curativa.
Os
sujeitos económicos que desenvolvem uma actividade económica que
seja poluidora e consequentemente causem prejuízos ambientais para a
comunidade, devem pagar todos os custos decorrentes da prevenção,
precaução e eventuais danos ao meio ambiente. Em suma, o poluidor é
aquele que degrada directa ou indirectamente o ambiente ou cria
condições que levam a sua degradação (recomendação do conselho
nº75/436 de 3 de Março) e tanto pode ser pessoa singular como
colectiva, publica ou privada, desde que exerça ou controle essa
actividade. O poluidor tem o dever de pagar as despesas para suportar
as medidas necessárias para evitar essa poluição ou para a
reduzir, a fim de respeitar as normas e as medidas equivalentes. Esse
pagamento pode ser mediante impostos, taxas, políticas de preços ou
benefícios fiscais.
Este
princípio interioriza os custos a quem os origina, i.e., torna os
gastos obrigação interna do possível poluidor. Evita-se assim que
o preço da actividade bem como a forma de evitar ou reparar danos
ambientais recaia sobre a sociedade, tornando-se um encargo do
poluidor e não do Estado. Funciona também como um incentivo á
redução da poluição e à procura de tecnologias alternativas e
menos poluentes. Actua ainda como princípio punitivo pois visa
reprimir o poluidor que terá de reparar o dano causado, ou custear a
sua reparação.
Este
princípio relaciona-se com a responsabilidade civil pois visa
imputar ao poluidor as despesas inerentes ao combate e prevenção da
poluição e à reparação dos danos ecológicos que der causa. Para
tornar efectiva esta obrigação do poluidor de reparar os danos
recorre-se ao instituto da responsabilidade civil, nomeadamente ao
artigo 562º do CC (“Quem estiver obrigado a reparar um dano
deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse
verificado o evento que obriga à reparação”.) que prevê a
reconstituição da situação que existia antes do facto que
originou o dano. Contudo uma vez que é difícil provar a culpa do
agente e ela de alguma forma aparece presumida é mais acertado
enquadrá-la na responsabilidade objectiva, que assenta no risco e
não na culpa. Daqui resulta que os danos destas actividades serão
suportados por aqueles que aufiram os lucros das mesmas.
4.
Dano ambiental
A
água, o solo, a temperatura, a fauna, a flora, a luz não são
susceptíveis de apropriação individual. O artigo 483º do Código
Civil sobre responsabilidade civil pressupõe uma violação de
direitos privados, o que implicaria que a tutela ambiental enquanto
protecção jurídica a bens públicos não apropriáveis, pareceria
não originar responsabilidade civil. Contundo este pensamento era
baseado numa ideia de renovação constante e infinita dos bens
ambientais, o que a evolução da humanidade mostrou ser falsa, pois
os bens ambientais são finitos e é necessária a sua protecção. A
Constituição da Republica Portuguesa no seu artigo 66º vem
consagrar um direito genérico a um ambiente sadio e ecologicamente
equilibrado e o dever de o defender. Esta norma ao reconhecer um
direito subjectivo reconhece também a afectação de um bem às
necessidades das pessoas individualmente consideradas, reconhecendo
assim o ambiente como bem jurídico.
Daqui
resulta um novo tipo de dano: o dano ambiental. É uma consequência
de uma ofensa ecológica ou lesão da Natureza, destruindo o direito
previsto na nossa CRP a um ambiente sadio e equilibrado. Esta lesão
ao meio ambiente tem deixado de ser vista como uma lesão a um bem
exterior ao Homem para passar a ser encarada como um lesão á
própria personalidade humana, i.e., à vida, à qualidade de vida e
à saúde das pessoas e a comprometer a sobrevivência das gerações
futuras.
O
meio ambiente carece assim de tutela, e usa a responsabilidade
ambiental como ferramenta jurídica adequada.
O
dano ambiental tem porém complexidade acrescida dada a sua natureza
de direito difuso, assente na dificuldade em determinar os sujeitos
que sofreram os efeitos de determinada degradação ambiental. É um
dano transfronteiriço, intemporal e difícil de valorar (pensemos
por exemplo nas consequências do acidente nuclear de Abril de 1986
em Chernobil)
4.1
Dano ecológico vs. Dano Ambiental
A
doutrina tem vindo a distinguir danos ambientais de danos ecológicos.
Os primeiros referem-se a lesão de bens jurídicos concretos, danos
pessoais ou patrimoniais sofridos reflexamente pela lesão de uma
componente ambiental. Este conceito reflecte uma posição mais
antropocêntrica.
Os
segundos danos são lesões causadas ao sistema ecológico natural,
sem que tenham sido violados direitos individuais, danos causados á
natureza em si mesma, numa posição mais ecocêntrica.
Os
danos ecológicos parecem não poder ser objecto de responsabilidade
civil tal como o instituto está previsto no Código Civil pois o bem
lesado é o ambiente em si mesmo, tendo natureza pública e não
sendo susceptível de apropriação individual, nem de transacção.
A responsabilidade ambiental por estes danos deve gerar obrigações
de natureza preventiva ou reparadora de tipo restaurativo e não de
tipo ressarcitório. Compete às autoridades administrativas a tutela
do património natural, e a protecção do ambiente desempenhando
funções de prevenção de lesões e reparação do mal infligido
A
noção de dano ambiental foi consagrada pela Directiva sobre
responsabilidade civil ambiental (2004/35/CE) que afirma que este
deve ser significativo, concreto, quantificável e imputável através
de um facto. Esta Directiva no seu artigo 2º exclui do conceito de
dano ambiental os danos pessoais ou patrimoniais, adoptando assim um
conceito de dano ambiental que integra somente os danos ecológicos
puros.
O
Decreto-lei n.º 147/2008 de 24 de Julho define danos ambientais na
alínea e) do artigo 11º em três categorias:
-
dano causado “às espécies e habitats naturais protegidos e
quaisquer danos com efeitos significativos adverso para a consecução
ou a manutenção do estado de conservação favorável desses
habitats ou espécies, cuja avaliação tem que ter por base o
estado inicial” .., “com excepção dos efeitos adversos
previamente identificados que resultem de um acto de um operador
expressamente autorizado pelas autoridades competentes, nos termos da
legislação aplicável”
-
danos causados á água, como qualquer dano que afecte adversa e
significativamente o estado ecológico, ou o potencial ecológico, e
o estado químico e quantitativo das massas de agua superficial ou
subterrânea, danos ao solo, qualquer contaminação do solo que crie
um risco significativo para a saúde humana.
-
dano causado ao solo» como qualquer contaminação do solo que crie
um risco significativo para a saúde humana devido à introdução,
directa ou indirecta, no solo ou à sua superfície, de substâncias,
preparações, organismos ou microrganismos;
Este
decreto-lei transpôs aquela Directiva 2004/35/CE para a ordem
jurídica portuguesa, prevendo um regime da responsabilidade por
danos ecológicos mas também um regime de responsabilidade civil por
dano ambiental. Este último regime institui a responsabilidade pelos
danos a direitos subjectivos e a interesses juridicamente tutelados.
Esta regulação dos dois regimes está enunciado no preâmbulo do
respectivo decreto-lei onde se estabelece, “por um lado, um regime
de responsabilidade civil subjectiva e objectiva nos termos do qual
os operados-poluidores ficam obrigados a indemnizar os indivíduos
lesados pelos danos sofridos por via de um componente ambiental” e
por outro lado, “fixa-se um regime de responsabilidade
administrativa destinado a reparar os danos causados ao ambiente
perante toda a colectividade”
A
responsabilidade ambiental é actualmente regulada por este
decreto-lei no seu capítulo II onde se prevê a indemnização de
lesões sofridas por determinados indivíduos em concreto (danos
ambientais) e no capítulo III preceituando a reparação de danos
provocados ao meio ambiente (danos ecológicos).
Note-se
que o artigo 10º deste decreto-lei estabelece que os lesados
referidos no capítulo II não podem exigir reparação nem
indemnização pelos danos que invoquem na medida em que esses danos
sejam reparados nos termos do capítulo III. Há assim uma
subsidiariedade da responsabilidade civil relativamente á
responsabilidade administrativa. Estamos assim em presença de um
regime bicéfalo, o instituto da responsabilidade por danos
ambientais tem assim em Portugal uma natureza jurídica dúplice e
subsidiária
4.2
Reparação do Dano
Uma
vez ocorrido um dano ambiental é necessária a sua reparação. O
Código Civil no seu artigo 562ª consagra o critério da
reconstituição natural da situação que existiria antes de ter
ocorrido o dano. Por sua vez Decreto-lei n.º 147/2008 de 24 de Julho
veio autonomizar o dano ecológico face ao dano ambiental e assim
prevê medidas específicas de reparação para este dano (artigos
14º, 15º e 16º) no seu Anexo V, pela restituição do ambiente ao
seu estado inicial (reparação primaria) ou quando desta reparação
não resultar a restituição do ambiente ao estado inicial, uma
reparação complementar.
Contudo,
o problema que aqui se levanta é na impossibilidade dessa
reconstituição natural, sendo irreversível o dano. Por exemplo, no
caso do navio petroleiro monocasco, Prestige, que afundou na costa
galega produzindo uma imensa maré negra que afectou uma ampla zona
compreendida entre o Norte de Portugal e as Landas em França, que
provocou inúmeros danos que seriam impossíveis de reparar na sua
totalidade, quer por questões económicas quer pela quantidade de
animais (ex-aves marinhas) que morreram em consequência desse
desastre.
Será
assim o dano ambiental susceptível de avaliação pecuniária? Não
há dúvidas que há danos que não têm preço, nomeadamente uma
extinção de uma espécie, mas isto também existe no âmbito do
Direito Civil. Se pensarmos no dano morte previsto no nosso Código,
embora pressuponha uma indemnização aos familiares, nunca poderia
pagar os danos reais e efectivos que a morte de um familiar causa.
Contudo, o código considera o dano morte susceptível de avaliação
pecuniária. Assim sendo também o dano ambiental é susceptível de
avaliação em dinheiro, embora muitas das vezes este valor fique
muito aquém do efectivo prejuízo causado ao ambiente. Nomeadamente
aplicando analogicamente o Código Civil no seu artigo 566º n.º 3,
o Tribunal pode julgar equitativamente dentro dos limites que tiver
por provados os prejuízos causados por uma lesão ambiental quando
não seja possível a sua reconstituição natural.
Falemos
agora de dano moral ambiental. Por exemplo, se uma floresta for
destruída poderá a comunidade receber uma quantia por perda de
fruição de um bem colectivo? A resposta parece ser afirmativa.
Contudo este dano moral não está previsto no RPRDE, pois não é um
dano ecológico.
Tendemos
a defender a aplicação neste caso do artigo 496º do Código Civil
(n.º 4 – o montante da
indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em
atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo
494º: poderá
a indemnização ser fixada, equitativamente, em montante inferior ao
que corresponderia aos danos causados, desde que o grau de
culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e
as demais circunstâncias do caso o justifiquem)
devendo a sua compensação reverter para o
Fundo de Intervenção Ambiental. Também os danos futuros poderão
apurados em sede do 564º n.º 2 do Código Civil (“Na
fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos
futuros, desde que sejam previsíveis; se não forem determináveis,
a fixação da indemnização correspondente será remetida para
decisão ulterior”) se e só quando forem
previsíveis, quando a sua verificação for altamente provável.
Na
doutrina alemã assim como em muitos países europeus, o critério de
determinação do dano passou a basear-se na ideia de suportabilidade
ou insuportabilidade, visando limitar o montante de indemnização
aos danos “razoáveis”.
5.
Responsabilidade Ambiental propriamente dira
A
responsabilidade ambiental pode ter uma natureza preventiva ou
reparadora, e dentro desta ultima pode ainda assumir contornos de
tipo restaurativo ou de tipo ressarcitório. A Directiva comunitária
pretendeu instituir um regime simultaneamente preventivo e reparador,
afastando-se assim do modelo típico da responsabilidade civil.
Considera-se tradicionalmente que sendo possível prevenir os danos
não há lugar a responsabilidade, esta só será accionada quanto a
danos ocorridos e visa repará-los e ressarci-los.
É
verdade que o instituto da responsabilidade, em si, tem sempre função
preventiva geral, contudo tem apenas um efeito tendencial ou
simbólico e diz respeito a danos hipotéticos, não pretendendo
evitar danos reais e concretos e dela não decorrem obrigações
concretas e imediatas de prevenção de danos, mas apenas um
desincentivo genérico à prática de actos danosos.
5.1
A responsabilidade na lei de Bases do Ambiente:
A
lei de bases do ambiente veio consagrar uma responsabilidade civil
ambiental pelos danos, sem que estes danos tenham como lesado um
individuo concreto. Reconhece-se assim o dano ecológico, admite-se a
ressarcibilidade de danos de natureza social ou colectiva o que
representa um avanço face ao regime do Código Civil que pressupõe
a existência de lesados individuais como já dissemos.
Esta
lei consagrou no seu artigo 41º um sistema de responsabilidade
objectiva ou pelo risco:
1 –
Existe obrigação de indemnizar, independentemente de culpa, sempre
que o agente tenha causado danos significativos no ambiente, em
virtude de uma acção especialmente perigosa, muito embora com
respeito do normativo aplicável.
2 – O quantitativo de indemnização a fixar por danos causados no ambiente será estabelecido em legislação complementar.
A
doutrina divide-se quanto a este preceito: a Prof. CARLA AMADO GOMES
não retira desta disposição um princípio geral de
responsabilidade objectiva por danos causados ao meio ambiente, face
à inexistência de uma remissão para uma listagem de actividades
potencialmente perigosas. estando assim ferido de uma amplitude
inaceitável.
Por
outro lado. o Prof VASCO PEREIRA DA SILVA retira deste artigo uma
responsabilidade objectiva e para este autor a remissão do seu nº 2
pode ser lida de maneira diversa da mera necessidade de outras
concretizações sob a forma de listagem, podendo ser essa
concretização efectuada via remissão do 510º n.º 2 do Código
Civil, associando deste modo o quantum indemnizatório á limitação
da responsabilidade objectiva em situações de dano gerado por
instalações de gás ou electricidade.
Em
apoio da tese defendida por este Professor encontramos na lei de
bases do ambiente um significado de dano significativo como a
frustração de uma utilidade proporcionada por um bem ambiental
(entenda-se por bem ambiental: ar, luz, agua, solo vivo, subsolo,
flora e fauna) que é objecto de tutela jurídica. Esta lesão
ecológica terá de ser grave, tendo os artigos 8º e seguintes uma
tipificação dessas lesões ecológicas: poluição atmosférica, a
perturbação do nível de luminosidade, a poluição hídrica,
danificação do solo ou subsolo, danificação da flora, danificação
da fauna, a ofensa da paisagem e a poluição sonora. Estaríamos
assim perante uma modalidade de responsabilidade objectiva a ser
aplicada casuisticamente de acordo com aqueles parâmetros e
princípios pelos Tribunais judiciais.
A
remissão do artigo 41º n. º 2 para legislação complementar
regulamentadora do quantum indemnizatório resulta até hoje numa
lacuna que deve ser suprida pelo dispositivo no artigo 566º n.º 3
do Código Civil que prevê quando não pode ser fixado o montante
exacto dos danos, o tribunal julgue equitativamente dentro dos
limites que tiver por provados, admitindo assim claramente a fixação
da indemnização segundo critérios judiciais.
O
artigo 40º n.º 4 garante o recurso aos meios gerias de direito para
os cidadãos directamente lesados, obterem a cessação das causas de
violação e a respectiva indemnização. Esta norma não deve ser
interpretada como atribuindo a cada cidadão individualmente
considerado, a titularidade de um direito ao ambiente e a uma
indemnização por lesões ambientais. Ela tem em vista as situações
em que a lesão ambiental provoca danos na esfera jurídica de
sujeitos individuais os quais são naturalmente tutelados através do
instituto da responsabilidade civil.
O
artigo 43º está directamente relacionado com a questão da
responsabilidade objectiva pois prevê o seguro obrigatório de
responsabilidade civil relativamente a actividades que envolvam alto
grau de risco para o ambiente.
5.2
A responsabilidade no Decreto-lei n.º 147/2008 de 24
de Julho
Por
sua vez, o Decreto-lei n.º 147/2008 prevê uma responsabilidade
objectiva e uma responsabilidade subjectiva. A primeira está no
artigo 8º que tem uma redacção semelhante ao artigo 483º do
Código Civil: “quem com dolo ou mera culpa ofender direitos ou
interesses alheios por via da lesão de um componente ambiental fica
obrigado a reparar os danos resultantes dessa ofensa”. O artigo
7º refere-se á responsabilidade objectiva: “quem em virtude do
exercício de actividade económica ofender direitos ou interesses
alheios por via da lesão de um qualquer componente ambiental é
obrigado a reparar os danos resultantes dessa ofensa
independentemente de culpa ou dolo”.
5.3
A responsabilidade no Código Civil
Na
aplicação da responsabilidade civil por danos ambientais podemos
recorrer ao sistema geral da responsabilidade civil do artigo 483º e
ss do CC. A concretização desta responsabilidade passa pelo
preenchimento dos pressupostos tradicionais sendo assim possível
responsabilizar o agente por uma lesão ambiental.
O
pressuposto da culpa poderá ser dispensado com recurso á presunção
do 493º n.º 2. do Código Civil, que considera que quem exerce uma
actividade perigosa se presume responsável pelos danos verificados,
excepto se demonstrar que tomou as providências exigidas pelas
circunstâncias com o fim de os prevenir.
A
responsabilidade objectiva ou pelo risco está regulada nos artigos
499º e seguintes do Código Civil, interessando especialmente para o
efeito o artigo 509º relativo aos danos causados por instalações
de energia eléctrica ou de gás, que pode configurar uma hipótese
de lesão do ambiente.
5.4
A responsabilidade na lei da acção popular (Lei n.º 83/95 de 31 de
Agosto)
Esta
Lei visa a tutela jurisdicional dos interesses difusos. Podemos
definir interesses difusos como interesses comuns a todos os membros
de uma comunidade e categoria, que não são susceptíveis de
apropriação individual por cada um dos seus membros individualmente
considerados, sendo, por isso, interesses subjectivamente
indeterminados. Estes não são interesses públicos nem interesses
privados, mas antes são interesses supra-individuais, comuns aos
membros de uma colectividade e cuja tutela pode ser efectuada pelo
Ministério Público, por entidades ou cidadãos que participem
desses mesmos interesses, nomeadamente mediante a Acção popular
(artigo 2º da LAP).
Será
o caso da qualidade de vida, da protecção do consumo, do domínio
público, da saúde e do ambiente. (artigo 1º n.º 2 LAP).
Interessa-nos
aqui especialmente os interesses difusos do ambiente e da qualidade
de vida que poderão assim ser defendidos mediante acção popular. O
artigo 22º enuncia uma situação de responsabilidade civil
subjectiva e o artigo 23º prevê a responsabilidade pelo risco. O
artigo 24º consagra um seguro de responsabilidade civil como
condição de início ou continuação de exercício de actividade
que envolva risco anormal para os interesses protegidos pela presente
lei.
5.5
Responsabilidade subjectiva ambiental
Como
acima se disse, a responsabilidade subjectiva ou também intitulada
de responsabilidade por facto ilícito culposo funda-se na culpa do
agente e contêm variados pressupostos, decalcados da
responsabilidade civil.
Em
primeiro lugar a ilicitude que abrange actos jurídicos que violem
normas legais, normas regulamentares e princípios gerais e todas as
actuações que infrinjam regras de ordem técnica e de prudência
comum que devam ser tidas em consideração.
Segundo,
o facto que tanto pode ser uma acção como uma omissão
administrativa. Esta ultima é muito frequente no Direito do Ambiente
nomeadamente nas medidas de “polícia administrativa”.
Terceiro,
a culpa na sua vertente de dolo ou negligência, é um pressuposto
essencial nesta responsabilidade subjectiva mas que será dispensado
na responsabilidade objectiva. Consiste essencialmente na
possibilidade de imputar um fato a alguém.
Quarto,
o dano ou prejuízo que como já vimos anteriormente suscita
problemas quanto á sua valoração.
Por
último, o nexo de causalidade, que é sem dúvida o pressuposto que
suscita maiores dificuldades de aplicação. Há que ter em conta que
normalmente os danos ao ambiente apresentam uma serie de causas,
sendo difícil apurar o nexo de causalidade. Uma forma de o fazer e
segundo o direito anglo-saxónico e a sua teoria da
markat-share-liability. Nos termos desta teoria cada empresa é
responsável pelos danos ambientais proporcionados na sua esfera de
actividade, na proporção da sua quota de mercado.
O
Decreto-lei n.º 147/2008 de 24 de Julho veio determinar, no seu
artigo 5º, a apreciação que a prova do nexo de causalidade assenta
num critério de verosimilhança e de probabilidade de o facto danoso
ser apto a produzir a lesão verificado, Este artigo aplica-se não
só a esta modalidade de responsabilidade subjectiva mas também à
responsabilidade objectiva e exige um grau de prova de “mera
justificação” em detrimento da prova stricto sensu. A
doutrina tem defendido que a imputação objectiva deve assentar na
conexão do risco: o facto seria assim imputável ao agente quando
este tiver criado ou aumentado o risco da verificação do resultado
lesivo e esse risco se tiver materializado no resultado.
O
ónus da prova cabe ao lesado, que deve provar a probabilidade de a
instalação ser apta a causar o dano, i.e., a probabilidade da
criação do risco pelo agente tendo em conta as circunstâncias do
caso concreto. Sendo risco a “eventualidade danosa potencial”, e
neste caso falamos de risco concreto, pois tem em conta o caso
concreto nomeadamente: elementos internos á própria instalação
(modo de funcionamento, situação da empresa, natureza e
concentração dos materiais utilizados e libertados) elementos
exteriores á mesma (meteorologia, tempo, lugar em que o dano
ocorreu, natureza do dano) e ainda outras circunstancias que apontem
para ou contra a causação do dano pela instalação
(particularidades técnicas, observância de standards ambientais,
processo de fabrico). O artigo 5º reclama ainda que seja apreciado:
o grau de risco e de perigo; a normalidade da acção lesiva (se é
normal ou não aquela instalação causar aquele tipo de dano), a
possibilidade de prova científica do percurso causal, o
incumprimento de deveres de protecção pois isto torna mais provável
que a instalação tenha causado aquele dano.
5.6
Pluralidade de responsáveis
Há
pluralidade de responsáveis por um dano ambiental quando ocorre um
concurso de causas podem se suscitar várias questões.
Quando
os sujeitos actuam em conjunto, mediante comparticipação, o
Decreto-lei n.º 147/2008 de 24 de Julho prevê uma responsabilidade
solidária, com direito de regresso, de uns perante os outros. Quando
não seja possível determinar o grau de participação de cada um
dos responsáveis, presume-se que a responsabilidade seja em partes
iguais.
Contudo
há casos em que os sujeitos não agiram em conjunto mas a actuação
de cada um deles, sendo separada da dos demais, contribuiu para
causar um dano, sendo certo que a actuação isolada de cada um não
seria suficiente para o causar. Por exemplo: nas margens do Rio Liz
desenvolvem-se uma serie de actividades económicas que fazem
descargas para o rio e sendo a actuação “somada” destas varias
empresas que pode causar um dano ambiental. Como se vai
responsabilizar estes sujeitos?
Como
já vimos anteriormente o artigo 5º prevê um nexo de causalidade em
termos mais amplos do que o previsto no Código Civil, e exige que se
tome em conta o cumprimento de deveres de protecção. Daqui resulta
que se cada um dos sujeitos soubesse da actuação danosa dos demais
e ainda assim nada fizesse para cessar a sua, podemos estabelecer um
nexo de causalidade e assume-se uma responsabilidade solidária entre
eles (co-devedor).
5.7
Natureza jurídico-publica vs natureza jurídico-privada
No
regime jurídico da responsabilidade ambiental verifica-se um
tratamento diferenciado relativamente á responsabilidade
administrativa e à responsabilidade dos particulares. Na Directiva e
no capítulo III do RJRDA consagra-se um regime de características
jurídico-publicas, já, por outro lado, no capítulo II do RJRDA,
encontramos um regime tipicamente privatista. O primeiro regime impõe
aos operadores um conjunto de deveres de prevenção e de reparação
de danos ambientais, independentemente de estarem ou não obrigados a
suportar os respectivos encargos. O segundo regime trata da relação
civilista entre um lesante e um lesado, nos termos da qual o primeiro
fica obrigado a ressarcir o segundo pela lesão que lhe infligiu. É
contudo indiscutível que ambos os capítulos deste decreto se
referem à responsabilidade civil
Verificando-se
simultaneamente uma diferenciação na competência do tribunal,
sendo a responsabilidade administrativa por actos de gestão pública
julgada pelo tribunal administrativo e a dos particulares ou actos de
gestão privada pelo tribunal judicial. Há assim uma falta de
unidade nas questões de responsabilidade civil no domínio ambiental
no ordenamento jurídico português.
Em
termos de jure condendo deverá assim se proceder a uma
unificação de todas as acções da responsabilidade administrativa,
quer sejam actos de gestão publica ou privada, e colocá-las perante
a mesma jurisdição, facilitando a aplicação dos conceitos e os
critérios de determinação. Nomeadamente quando os cidadãos
intentam acção de responsabilização da Administração e
simultaneamente de uma entidade privada deveriamos ter uma acção
única, administrativa comum e perante um tribunal administrativo.
Por
exemplo no Código Civil no seu artigo 1346º sobre direitos reais,
especificamente sobre relações de vizinha pela emissão de danos na
propriedade do vizinho. Esta relação de vizinhança
tradicionalmente era considerada como privada mas tende hoje a
tornar-se administrativa em virtude dos deveres urbanísticos) e
deveria estar contida numa norma administrativa. Como este caso em
concreto também os privados podem ser demandados por privados
perante tribunais administrativos (37º n.º 3 CPTA) desde que
preencham dois requisitos fundamentais: violem uma norma
administrativa e os particulares requerentes tenham alertado a
administração para a eventual produção de dano e esta nada tenha
feito. Quando os requisitos estão cumulativamente preenchidos os
particulares podem intentar a acção em tribunal administrativo.
Preferível
talvez fosse a criação de tribunais ambientais de competência
especializada que julgassem exclusivamente litígios ambientais,
embora esta solução não esteja consagrada em nenhum ordenamento
jurídico ficando-se agora como mera “sugestão”
5.8
Responsabilidade objectiva
A
responsabilidade objectiva ou responsabilidade pelo risco
caracteriza-se pelo agente responder pelos danos a que deu origem,
ainda que tenha actuado rigorosamente de acordo com o nível de zelo
e de diligência que lhe era exigível.
A
responsabilidade objectiva esta prevista no artigo 7º e no artigo
12º do RJRDA que remetem para o Anexo III, onde esta listado um
conjunto de actividades que se consideram perigosas.
Se
alguém tira proveito de uma actividade perigosa e justo que também
responda pelos danos por ela causados independentemente de culpa.
Exige-se assim três requisitos: ocorrência de danos significativos
no ambiente; verificação de acção especialmente perigosa e
estabelecimento do nexo de causalidade entre os referidos danos e a
acção.
5.9
Responsabilidade administrativa por actos lícitos
A
administração é responsável perante os particulares pelos actos
administrativos legais ou actos materiais lícitos que tenham imposto
encargos ou causado prejuízos especiais e anormais. Exemplo disso é
a expropriação. No Direito do Ambiente esta responsabilidade tem um
papel muito importante, nomeadamente nos casos de estado de
necessidade ambiental.
Conclusão
Concluímos assim que os prejuízos causados ao ambiente podem ser
danos ambientais ou danos ecológicos. Para os primeiros o sistema
jurídico prevê um regime muito semelhante ao Código Civil uma vez
que se tratam de direitos subjectivos das pessoas que foram violados.
Já para os segundos o regime está fundamentalmente sedeado no
Decreto-lei n.º 147/2008 de 24 de Julho que aprovou o regime
jurídico da responsabilidade por danos ambientais. Aqui é visível
a dificuldade em reparar os danos pela sua difícil ou impraticável
avaliação pecuniária.
Vimos
ainda que a responsabilidade pode ser subjectiva ou objectiva, sendo
esta ultima independente de culpa, e que ambas as modalidades estão
previstas em muita da nossa legislação interna. Encontramos
mecanismos de presunção de causalidade e de inversão do ónus da
prova.
O
caminho para a regulação deste ramo do Direito está longe de estar
completo, e ainda há um longo caminho a percorrer para uma tutela
absoluta do meio ambiente.
Certo
é que sem dúvida o Direito do Ambiente e em especial a
responsabilidade ambiental abriu novas perspectivas ao domínio das
obrigações dos agentes económicos e em geral das actividades
humanas no estado actual de desenvolvimento económico e tecnológico.
Bibliografia:
AMARAL,
Freitas do, Lei de Bases do Ambiente e Lei das Associações de
Defesa do Ambiente
AMARAL,
Freitas do, Direito Administrativo, vol. III
ANTUNES,
Tiago, Da Natureza Jurídica da Responsabilidade Ambiental
CRUZ,
Branca Martins, Responsabilidade Civil por Dano Ecológico
CANOTILHO,
Gomes, o Problema da Responsabilidade do Estado por Actos Lícitos
GOMES,
Carla Armado, A Responsabilidade Civil por Dano Ecológico
SILVA,
Vasco Pereira, Verdes são Também os Direitos do Homem
SILVA,
Vasco Pereira, Verde Cor do Direito
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