domingo, 20 de maio de 2012



Os Embargos Administrativos na Lei de Bases do Ambiente





Introdução

Não é segredo que a matéria respeitante aos embargos administrativos tem sido amplamente desenvolvida e debatida no seio da doutrina e da jurisprudência. O presente trabalho não pretende ser mais uma reprodução de toda a problemática que rodeia os embargos administrativos.
No presente trabalho serão, com mais rigor, desenvolvidas algumas das questões que me parecem cruciais e interessantes: a natureza jurídica dos embargos de ambiente, as suas vantagens e desvantagens. Não descurando do desenvolvimento sumário de outras questões igualmente relevantes como: as razões que fundamentam a existência dos embargos administrativos e a sua necessidade no âmbito da Lei de Bases do Ambiente.








I.                  Dos Embargos Administrativos – Aspectos Gerais

O regime jurídico dos embargos administrativos encontra-se, actualmente, na Lei nº 13/2002 de 19 de Fevereiro, mais precisamente no art. 42º. O art. 42º desta Lei diz-nos o seguinte:

Aqueles que se julguem ofendidos nos seus direitos a um ambiente sadio e ecologicamente equilibrado poderão requerer que seja mandada suspender imediatamente a actividade causadora do dano, seguindo-se, para tal efeito, o processo de embargo administrativo.”

Esta Lei de Bases do Ambiente constitui a versão mais actualizada da Lei n.º 11/87, de 7 de Abril e como tal é necessário proceder a uma primeira análise do sentido do regime dos embargos administrativos, para assim entendermos qual a sua utilidade para quem se queira servir deles como meio de tutela.
Os embargos administrativos constituem um meio jurisdicional específico para a defesa dos direitos subjectivos das relações jurídicas multilaterais no âmbito ambiental. As relações jurídicas multilaterais no âmbito ambiental podem ser definidos como as relações em que existem várias partes e nas quais a Administração e os diferentes particulares se envolvem numa rede de ligações jurídicas, de que resultam direitos e deveres recíprocos. Quando esta reciprocidade sofre alguma perturbação ou alteração e o particular se sente lesado nos seus direitos a um ambiente sadio e ecologicamente equilibrado por uma actuação lesiva da Administração; pode o particular fazer-se valer do instituto dos Embargos Administrativos para tutelar a sua situação jurídica.
 O Ambiente tem uma importância cada vez maior e cada vez mais é intensificada a tomada de consciência da necessidade da sua protecção. No entanto, crescentes são também as situações que podem corresponder a “ofensas ecológicas” que, nas palavras do Prof. Freitas do Amaral são todo o acto ou facto humano culposo ou não que tenha como resultado a produção de um dano nas componentes ambientais protegidas por lei.


A Lei de Bases do Ambiente (doravante, LBA) prevê mecanismos de resposta quanto a essas “ofensas ecológicas”, consagra a obrigação de indemnização nos termos da responsabilidade objectiva (art. 41º) e a possibilidade de recurso a embargos administrativos (art. 42º) atribuindo o direito ao ofendido de requerer que seja mandada suspender a actividade causadora do dano (ecológico) através daquele mecanismo processual de embargo administrativo.
Em diversas situações, é perfeitamente defensável que o particular necessite de obter uma ordem de um tribunal, provisória de suspensão de uma actividade, no sentido de acautelar o sentido útil da decisão final que venha a ser proferida, muitas vezes pelo facto de os danos se demonstrarem irreparáveis.
Os embargos administrativos dispõem então de diversas características, nomeadamente, quanto aos elementos processuais:
a)                  Sujeitos activos: Titulares dos direitos subjectivos provindos de relações jurídicas (pública ou privada) multilaterais, ambientais;
b)                 Sujeitos passivos: Quaisquer entidades públicas ou privadas que pratiquem a lesão e concretizem o dano ambiental;
c)                  Pedido: a suspensão imediata do comportamento que está a lesar o direito do lesado e constitui um dano para o ambiente; e
d)                 Causa de Pedir: é o conjunto de factualidades mencionadas e descritas pelo lesado como acontecimento da vida real proveniente de uma relação multilateral ambiental desenvolvida entre este e o sujeito passivo; que vai culminar no direito subjectivo que integra a esfera jurídica do lesado.

Após uma primeira introdução à matéria dos embargos administrativos, retiram-se diversas conclusões, nomeadamente que, o legislador tomou em consideração o esforço de consciencialização da colectividade relativamente à importância que a protecção do ambiente e que a necessidade de meios jurisdicionais que efectivem essa protecção, são hoje indispensáveis. Outra conclusão a retirar é que um meio possível e defendido pela doutrina, até como único meio jurisdicional específico para a defesa destes direitos subjectivos que sobrevêm das relações multilaterais ambientais estabelecidas entre os diversos possíveis intervenientes, são os embargos administrativos.


No entanto, diversas críticas se multiplicam no tocante a este regime. A doutrina tem apontado diversas; desde a sua incompletude e insatisfatória regulação jurídica que tem obrigado a doutrina a denominar os embargos administrativos no âmbito do ambiente ou embargos do ambiente como uma “construção de juristas”, obrigando e que seja feito um esforço no sentido da chamada, preservação jurídica ambiental, reconstruindo a intenção do legislador de modo a procurar dar algum conteúdo útil a tais normas jurídicas.







II.              O Regime Jurídico dos Embargos de Ambiente

A interpretação do regime jurídico dos embargos administrativos e a sua natureza jurídica tem originado na doutrina e na jurisprudência variadas questões de interpretação e de integração deste instituto. Como bem refere o Professor Vasco Pereira da Silva, há pelo menos duas questões a colocar: constitui este meio de tutela, um meio jurisdicional ou uma forma de actuação da Administração? E, são os embargos administrativos um procedimento administrativo ou um processo judicial?
As razões de fundo desta questão prendem-se com o facto de o próprio legislador fornecer informações contraditórias. A denominação “embargos administrativos” aponta para um consideração de que estes talvez se tratem de um meio administrativo de tutela; mas por outro lado, o art. 45º, conduz à aparência de que estamos perante um meio judicial.
A este propósito se pronunciou o Professor Freitas do Amaral, dizendo o Exmo. Professor que esta previsão legal contém uma contradição insanável: não há nenhum processo de embargo administrativo que seja da competência dos tribunais, ou há embargos que são da competência da Administração activa, ou há embargos judiciais, que são da competência dos tribunais. Propondo o Professor uma interpretação correctiva do art. 42º, considerando-se que ela não diz respeito a um procedimento administrativo mais a um processo judicial, não restando dúvidas que o legislador atribui os “embargos de ambiente” à competência de um tribunal.

O Professor Vasco Pereira da Silva, também se pronunciou a este propósito, acerca do regime jurídico dos embargos administrativos referindo que estes não se encontram desenvolvidos em regime ulterior e que, sendo este um meio específico de tutela do ambiente que está incompleto, o Exmo. Professor aponta por uma de duas soluções: ou admitimos que apenas iremos reconhecer efectividade a este meio quando ele se encontrar devida e totalmente regulado; ou então procuramos fazer corresponder a previsão legal ( dos embargos administrativos) a um meio contencioso pré-existente, garantindo assim a imediata tutela dos direitos subjectivos no domínio do ambiente. O Professor acaba por optar por este último meio, utilizando como argumento chave o facto de estarem em causa a protecção de direitos subjectivos de uma relação jurídica que contém e é conformada pelo direito fundamental ao ambiente (que é directamente aplicável e vincula entidades públicas e privadas – arts. 17º e 18º CRP), estando assim constitucionalmente assegurada a tutela judicial plena e efectiva desses direitos (arts. 20º e 268º, nºs. 4 e 5).
Um segundo problema consiste em precisar se os “embargos do ambiente” constituem um meio processual do contencioso administrativo ou do processo civil. O disposto no art. 45º, nº1 aponta no sentido da segunda opção: efectivamente, e tendo em conta a anterior formulação do art. 45º, que atribuía o conhecimento das acções a que se referem os embargos do ambiente à competência dos tribunais comuns, os embargos administrativos são considerados como um meio processual do processo civil.
O terceiro e último problema a colocar é o de saber se os embargos de ambiente são um meio principal ou um meio acessório, ou seja, se configuram uma acção principal ou uma providência cautelar. Temos de tomar em apreciação o anterior art. 45º, no qual o legislador se refere a este meio processual como uma “acção”, no entanto, estabelece-se agora que o pedido do particular feito ao juiz por intermédio desse meio processual é o da “suspensão imediata” da actividade causadora do dano (art. 42º da LBA), o que aponta para o facto de estarmos perante uma providência cautelar e não uma acção.
Feitas as considerações preliminares acerca dos embargos administrativos, não é despiciendo mencionar mais alguns (acrescentando aos já mencionados na Parte I deste trabalho) dos elementos constitutivos do regime jurídico dos embargos administrativos. E relativamente aos pressupostos processuais, podemos mencionar que a competência


para o conhecimento deste meio processual é dos tribunais comuns. Com efeito, antes da reforma do processo civil, a doutrina já se dividia acerca da figura cuja regulação devia subsumir-se à dos “embargos do ambiente” e estando a regulação deste instituto incompleta, tomando a opção mencionada pelo Professor Vasco Pereira da Silva, é necessário reconduzir esta previsão legal à de outro meio contencioso pré-existente. Torna-se assim necessário ler as disposições reguladoras dos embargos do ambiente à luz dos preceitos constitucionais e tendo em atenção a regulação dos meios existentes nas leis de processo (que sejam susceptíveis de ser enquadrados na Lei de Bases), com a finalidade de procurar determinar o alcance e a natureza desta forma de protecção jurídica.
Já a solução proposta pelo Professor Freitas do Amaral, com a concordância do Professor Gomes Canotilho, seria a de reconduzir a previsão legal deste meio processual de defesa do ambiente ao procedimento cautelar de embargo judicial de obra nova regulado no art. 412º e ss do Código de Processo Civil (doravante, CPC), considerando o Exmo. Professor que o significado da utilização da expressão “embargos administrativos” é, não mais, que conferir ao lesado o direito a utilizar o processo especial de embargo judicial de obra nova, beneficiando do regime mais favorável que nesse processo detém a Administração Pública. Retirando-se daqui a conclusão que o lesado no seu direito ao ambiente pode utilizar o meio processual do embargo de obra nova sem quaisquer limitações de prazo, como se de uma autoridade pública se tratasse (art. 413º, nº2 CPC).
Mas, a recondução da previsão legal dos ditos embargos à regulação do embargo de obra nova levanta alguns problemas de compatibilização de regimes e os argumentos aduzidos são:
·                    Enquanto o embargo de obra nova tem por finalidade a tutela dum direito real, o embargo do ambiente visa proteger os direitos subjectivos em matéria ambiental, consubstanciando-se estes direitos em direitos de natureza diferente. Os direitos subjectivos susceptíveis de serem tutelados em matéria ambiental são, em regra, relativos, pois consistem em direitos a uma concreta acção ou omissão por parte de entidades públicas ou privadas, no âmbito de relações obrigacionais de natureza bilateral ou multilateral, como já mencionado;



·                    O embargo de obra nova previsto no CPC, visa suspender uma construção, enquanto o embargo do ambiente prossegue a imediata cessação de uma actividade poluente; em termos substanciais em nada se relacionam estes institutos.
·                    A versão originária do art. 414º, nº1 do CPC, anterior à reforma do processo civil, colocava outra dificuldade na compatibilização das duas figuras ao proibir o embargo de obras do Estado ou de autarquias locais. Assim, o embargo de obra nova apenas poderia ser prosseguido no âmbito das relações jurídico-privadas, e não no âmbito das relações jurídico-públicas, nomeadamente de direito do ambiente.

Visando resolver esta última questão, o Professor Gomes Canotilho defendia a conjugação das normas do CPC com as da Lei das Associações de Defesa do Ambiente (Lei nº 10/87, de 4 de Abril), nomeadamente com a norma que confere a tais associações legitimidade para “propor acções necessárias à prevenção ou cessação de actos ou omissões de entidades públicas ou privadas que constituam factor de degradação de ambiente” – art. 7º, nº1, a) do referido diploma. Entendendo o Exmo. Professor que o recurso a tal conjugação tornaria possível a utilização do embargo de obra nova em matéria ambiental, mesmo relativamente a actuações do Estado ou de autarquias locais, alicerçando-se no fundamento jurídico-legal dos preceitos da Lei de Bases do Ambiente e da Lei das Associações de Defesa do Ambiente.
No entanto, o Professor Vasco Pereira da Silva não se determina com tal posição, uma vez que argumenta que esta conduz a uma solução contra legem: além dos mencionados problemas de compatibilização entre os dois meios processuais, o referido art. 7º, nº1, a) limita-se a atribuir legitimidade processual às associações de defesa do ambiente, não se podendo retirar do seu conteúdo que haja qualquer permissão do funcionamento do embargo contra entidades públicas. E ainda que tal fosse possível, se o embargo de obra nova ambiental pudesse ser prosseguido contra entidades públicas, no caso do pedido ser efectuado por associações de defesa do ambiente, tal meio não podia ser utilizado por qualquer particular em relação à Administração, em conclusão: a tutela individual dos privados no âmbito das relações administrativas de ambiente permaneceria com grandes falhas.




Neste sentido, o Exmo. Professor Vasco Pereira da Silva enumera três soluções teóricas, passíveis de recondução dos embargos do ambiente à regulação de outros meios processuais pré-existentes:

A.                Uma primeira tese, defendida pelo Professor Freitas do Amaral e Professor Gomes Canotilho, que procede à equiparação dos embargos do ambiente ao embargo de obra nova. No entanto, apenas comporta a tutela dos direitos subjectivos em matéria ambiental quando estiverem em causa relações jurídicas privadas, excluindo assim, a protecção destes direitos perante entidades públicas;

B.                 A segunda tese pretende fazer corresponder os embargos do ambiente a um dos seguintes meios processuais do contencioso administrativo:

                                                       i.            A suspensão da eficácia do acto administrativo, prevista nos arts. 128º e ss. do CPTA, que consiste numa providência cautelar susceptível de ser utilizada no âmbito das relações administrativas de ambiente, sempre que exista um qualquer acto administrativo recorrível. Mas, a utilização deste meio ao nível das relações de ambiente seria limitada, tendo em conta que muitas das actuações administrativas que lesam o ambiente não decorrem de actos administrativos, mas sim de actuações de carácter técnico;

                                                     ii.            A intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, prevista nos arts. 109º e segs. do CPTA, é um processo urgente que pode ser requerido quando a célere emissão de uma decisão de mérito que imponha à Administração a adopção de uma conduta positiva ou negativa se revele indispensável para assegurar o exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade ou garantia, por não ser possível ou suficiente o decretamento de uma providência cautelar (nº1 do art. 109º). De acordo com o nº2 do referido preceito, a intimação também pode ser dirigida contra particulares;


                                                   iii.            A acção para o reconhecimento de direitos ou interesses legalmente protegidos, referida nas alíneas a) e b) do nº2 do art. 37º do CPTA, é considerada um meio principal na qual inexiste o efeito suspensivo imediato que constitui uma característica dos embargos do ambiente de acordo com a Lei de Bases, sendo assim posta em causa a plenitude da tutela assim conseguida ao excluir o âmbito das relações privadas de ambiente.

C.                 A última tese é denominada por tese “mista” pois equivale os embargos do ambiente tanto ao embargo de obra nova, como aos mencionados meios do contencioso administrativo. Esta tese implica a existência de uma dualidade de jurisdições relativa a um único meio processual no que respeita à tutela dos direitos das relações ambientais, e a consequente possibilidade de ocorrência de conflitos de jurisdição. Consegue ainda assegurar uma tutela mais ampla em matéria ambiental do que as duas anteriores: a defesa dos direitos ambientais afectados em relação a privados era prosseguida através do embargo de obra nova e em relação a entidades públicas se utilizar-se-iam os meios processuais do contencioso administrativo.

Por outro lado, apesar da conjugação de todos estes meios processuais, os direitos dos particulares continuavam a carecer de uma tutela plena.

Em conclusão, pode dizer-se que, a tentativa de corresponder os embargos em matéria ambiental a outros meios do contencioso não se revelava completamente satisfatória porque não conseguia garantir a tutela de todos os direitos ambientais que necessitavam ser defendidos. Toda a situação da tutela judicial do direito ao ambiente inquinava sempre no surgimento de casos em que se observava uma sobreposição de meios processuais e de jurisdições competentes, susceptível de criar graves problemas de denegação de justiça.
Perante estes possíveis cenários, colocou-se a questão da inconstitucionalidade das disposições reguladoras dos embargos do ambiente, por violação dos Princípios do Acesso à Justiça e da Tutela Jurisdicional Plena e Efectiva dos cidadãos (arts. 20º e 268º, nºs. 4 e 5 da CRP).

Assim, colocava-se a questão da inconstitucionalidade parcial (apenas na medida em que a recondução dos embargos do ambiente a outros possíveis meios processuais conduzisse a situações de ausência de tutela ou até da sua sobreposição) do art. 42º da Lei de Bases, fosse por acção ou por omissão.
A inconstitucionalidade por acção verificar-se-ia nos casos em que o meio processual poderia ser considerado inútil ou de difícil e incerta aplicação, pela violação do direito fundamental ao Ambiente (art. 66º CRP), que prevê a existência de meios procedimentais e processuais necessários e adequados à tutela do direito em causa, e pela violação do direito fundamental de Acesso à Justiça, bem como a uma Tutela Judicial Plena e Efectiva dos direitos dos cidadãos – arts. 20º e 268º, nºs. 4 e 5 da CRP.Por outro lado, a inconstitucionalidade por omissão das medidas legislativas necessárias para tornar exigíveis as normas constitucionais - art. 283º da CRP - uma vez que estava em causa a preterição de um comportamento devido, que se consubstanciava na obrigação de dar realização processual ao direito fundamental ao Ambiente (art. 66º CRP).





III.           Da situação actual dos Embargos de Ambiente

Com a reforma do processo civil de 95/96, a situação da tutela judicial do ambiente é alterada. A modificação das normas processuais que regulam o embargo de obra nova parece denunciar uma intenção do legislador no sentido de considerar a recondução dos embargos de ambiente aos meios contenciosos pré-existentes; tal como defendido por algumas teses já mencionadas.
A nova estrutura do art.414º do CPC estabelece que “não podem ser embargadas (…) as obras do Estado, das demais pessoas colectivas públicas e das entidades concessionárias de obras ou serviços públicos quando, por o litígio se reportar a uma relação jurídico-administrativa, a defesa dos direitos ou interesses lesados se dever efectivar através dos meios previstos na lei de processo administrativo contencioso”. “A contrario”, se retira deste preceito que o embargo pode ser utilizado também contra entidades públicas, no âmbito de relações administrativas de ambiente, sempre que não exista um meio específico do contencioso administrativo.

Deste modo, veio conferir-se sentido útil aos embargos administrativos previstos na Lei de Bases do Ambiente, fazendo-os corresponder ao embargo de obra nova, assim como a outros meios do contencioso administrativo.

Em jeito de conclusão e de forma sumária, o novo regime legal dos embargos do ambiente determina então:

·                    A aplicabilidade do embargo de obra nova em matéria ambiental, sempre que estejam em causa relações jurídico-privadas;

·                    A aplicabilidade do embargo de obra nova também às relações administrativas mas somente nos casos em que não exista um meio específico do contencioso administrativo.

Quando se estiver perante uma relação administrativa do ambiente, deve-se apurar:

1.                  Se a lesão do direito ao ambiente foi causada por um acto administrativo recorrível, caso em que existe um meio específico do contencioso administrativo, que consiste na suspensão da eficácia do acto, pelo que é ele o aplicável;
2.                  Se a lesão do direito subjectivo ambiental foi causada por um privado no âmbito de uma relação administrativa multilateral, aqui, existe um meio específico do contencioso administrativo para paralisar essa actividade: é a intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias;
3.                  Nos demais casos de relações administrativas ambientais, e na ausência de outras providências cautelares específicas do contencioso administrativo, pode ser utilizado o embargo de obra nova (por exemplo, num caso onde se verifica uma lesão no ambiente causada por uma actuação administrativa de carácter técnico).

Mencionadas as principais características do novo regime legal; cabe agora enunciar algumas vantagens do mesmo. São as seguintes:
a)                  A inequívoca vontade do legislador ao proceder à equiparação da previsão legal do embargo do ambiente ao embargo de obra nova como meio eficaz de


tutela dos direitos subjectivos nas relações jurídicas ambientais, ainda que sem abdicar da utilização dos meios processuais do contencioso administrativo;

b)                 O estabelecimento de um critério de subsidiariedade, que se traduz na extensão do âmbito do embargo de obra nova também às relações administrativas de ambiente, sempre que não exista outro meio processual específico do contencioso administrativo. Deste modo são solucionados os problemas levantados pela deficiente tutela dos direitos subjectivos públicos em matéria ambiental através da preferência por um meio processual mais eficaz;

c)      A delimitação mais clara e separação dos diferentes meios processuais, no que diz respeito à utilização de meios do processo civil e do processo administrativo.

No entanto, é igualmente importante não deixar passar em branco, alguns dos possíveis inconvenientes:

a)                  A permanência da dualidade de jurisdições em matéria de contencioso do ambiente. Com a agravante de que, o facto da delimitação de jurisdições já não estar relacionada com a natureza da relação jurídica em causa;

b)                 A forte possibilidade de continuarem a existir conflitos positivos e negativos de jurisdição. Pois os direitos das relações administrativas em matéria ambiental tanto podem ser da competência dos tribunais comuns como dos tribunais administrativos. Este cenário potencia uma incompatibilidade entre este regime legal e a opção constitucional de atribuir aos tribunais administrativos a competência para “o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas” (art. 212º, nº 3 CRP).







Bibliografia

- Amaral, D.F. (1994). Lei de Bases do Ambiente e Lei das Associações de Defesa do Ambiente. In: Direito do Ambiente. Lisboa.

- Canotilho, J.G. (1994). Relações Jurídicas Poligonais, Ponderação Ecológica de Bens e Controlo Judicial Preventivo. In. Revista Jurídica do Urbanismo e do Ambiente, nº 1;

- Dias, J. F. (1997). Tutela Ambiental e Contencioso Administrativo – Da Legitimidade Processual e das suas consequências. Coimbra: Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra

- Silva, V.P. (1997). Da Protecção jurídica Ambiental – Os Denominados Embargos Administrativos em Matéria de Ambiente. Lisboa: A.A.F.D.L. (2002). Verde Cor de Direito, Lições de Direito do Ambiente. Coimbra: Almedina.

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