terça-feira, 22 de maio de 2012

Responsabilidade Ambiental

                             Responsabilidade Ambiental
 




Modern technology
Owes ecology
An apology
Alan M. Eddison









Sumário



                        I – Introdução

                        II – Direito ao Ambiente

                        III – Responsabilidade Ambiental

                        IV – Regime Jurídico da Responsabilidade Ambiental

                        V – Responsabilidade Objectiva

                        VI – Responsabilidade Subjectiva

                        VII – Danos Ambientais

VIII - Breve referência à tutela do Ambiente através Direito Penal

IX – Conclusão

X - Bibliografia




 I - Introdução

O direito ambiental é, indubitavelmente, um dos ramos do Direito mais importantes da sociedade contemporânea, devido, em larga causa, ao desenvolvimento industrial, tecnológico e ao consumo em massa, que por sua vez elevaram a produção de bens, causando uma degradação ambiental também jamais observada. Actualmente, a degradação da natureza é maior do que a sua recomposição e, consequentemente, o planeta Terra tem vido a sofrer alterações drásticas com repercussões no presente e ainda futuro.

Ao longo dos tempos, a tutela e proteção do ambiente tem sido um valor a ter em consideração no quotidiano de cada um de nós. Deste modo, e devido à crescente intervenção do Homem na sociedade, a problemática ambiental ocupa, actualmente, uma das maiores inquietações de governantes, empresários, juristas, técnicos, cidadãos e demais intervenientes duma nova sociedade, agora mais preocupada com o frágil equilíbrio ecológico do nosso planeta. Muito, quase tudo, está ainda por fazer: é indispensável intervir no planeamento, gestão e ordenamento legal do ambiente.

Para tanto, não haverá forma melhor de proteger o meio ambiente do que responsabilizar a sociedade civil pela ocorrência do dano ambiental. Não é de agora que existem normas e cunho ambiental, tanto no nosso ordenamento jurídico, como no estrangeiro. Até mesmo na Bíblia há referências sobre a protecção do meio ambiente

Como tal, torna-se relevante analisar o regime da responsabilidade ambiental, quer a nível civil, quer penal, de modo a concretizar a censura subjacente aos comportamentos humanos que prejudiquem o valor em questão.













II - Direito ao Ambiente

O direito ao ambiente é configurado como um direito fundamental com garantia constitucional, designado de terceira geração. É maioritariamente entendido como um direito subjectivo público com natureza difusa, na medida em que ninguém se pode apropriar, pertencendo a toda a comunidade. Constitui um bem colectivo, imaterial, inapropriável, um bem público de fruição comum. Com carácter multifactado, será legítimo admitir um verdadeiro direito ao ambiente que terá por objecto o conjunto de valores ambientais reconhecidamente consagrados.

A Constituição da República Portuguesa (doravente CRP) de 1976 introduziu o primeiro artigo ambiental no panorama constitucional português. Posteriormente, foi sujeita a três alterações que ocorreram em 1982 com a 1ª revisão constitucional, em 1989 com a segunda revisão constitucional e na quarta em 1997.

O artigo 66º da CRP, sob a epigrafe de “ambiente e qualidade de vida”, garante a tutela subjectiva do direito do ambiente, assegurando a todos o direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender, sendo uma das tarefas fundamentais do Estado, ao abrigo do art. 9º, al e) da CRP.

O nº2 do 66º, por sua vez, faz menção às várias formas do Estado assegurar a referida tarefa fundamental, materializando princípios, como o da precaução, da integração e da solidariedade intergeracional, estando desenvolvidos na Lei de Bases do Ambiente (LBA). No capitulo VII deste ultimo diploma legal, relativo aos direitos e deveres dos cidadãos, encontra-se prevista, nos termos do artigo 41º, a responsabilidade objectiva e, no preceito 48º é estabelecida a obrigatoriedade de remoção das causas da infração e da reconstituiçao da situação anterior.













III - Responsabilidade ambiental

A responsabilização dos actos humanos objectivam-se na garantia da vitima de modo a obter a reparação integral dos prejuízos causados por terceiros. Enquanto parte do direito obrigacional, consiste do direito da vítima que sofre prejuízo de ser ressarcida, impondo-se ao causador do dano obrigação de repará-lo. A responsabilidade ambiental surgiu, como primeiro momento, na Lei de Bases de Ambiente, em 1987, retomada em 1999 no Livro Verde. Um ano depois, figura no Livro Branco, aparecendo em anos posteriores em diversas directivas, decretos-lei e relatórios da Comissão.

A tutela do equilíbrio ecológico dos componentes ambientais “per se”, enquanto garante de um abiente de vida humano, como e constitucionalmente proclamado. É neste contexto que a responsabilidade adquire relevância, em especial a  responsabilidade objectiva, que determina a obrigação do agente indemnizar sempre que tenha causado danos significativos ao ambiente, independentemente de culpa, em virtude de uma acção especialmente perigosa. Quando suceda um dano ambiental de impossível recuperação , é admitida a indemnização em espécie. A teoria da responsabilidade civil foi elaborada a partir de cados de espécies, decisões de juízes, etc.

A Lex Aquilia, quando da Republica de Roma, no no de 468 a.C., constituiu-se como uma das maiores revoluções nos conceitos jus-romanisticos em termos de responsabilidade civil, tendo emprestado o nome aquiliana à responsabilidade extracontratual em oposição à contratual.








IV- Regime Jurídico da Responsabilidade Ambiental

                       

Princípio de poluidor - pagador



O Regime Jurídico da Responsabilidade por Danos Ambientais (RJRA), é objecto do Decreto-Lei nº 147/2008, de 29 de Julho, que transpõe a Directiva nº 2004/35/ CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 21 de Abril de 2004, que aprovou com base no principio de poluidor-pagador, o regime relativo à responsabilidade ambiental. O princípio do poluidor pagador tem origem na Recomendação da OCDE de 26 de Maio de 1972. Este princípio refere que “o poluidor deve suportar as despesas da tomada de medidas de controlo da poluição decididas pelas autoridades públicas para assegurar que o meio ambiente se mantenha num estado aceitável”. O artigo 174º nº 2 do Tratado da União Europeia indica que a Comunidade prossegue os seus objectivos ambientais tendo em conta o princípio indicado. A nível interno, a Constituição da República Portuguesa impõe ao Estado a tarefa de assegurar a compatibilidade entre a Política Fiscal e o desenvolvimento ambiental, com a devida qualidade de vida.

O princípio do Poluidor Pagador é visto como a matriz da responsabilidade ambiental e assume como principal objectivo a responsabilização do agente económico pelos danos causados à comunidade, resultantes do exercício de uma actividade poluente. A finalidade não é somente compensar as ofensas ao ambiente, mas sim levar os agentes económicos a minimizarem os riscos inerentes às suas actividades poluentes, como nos indica a Directiva 2004/35 de 21 de Abril de 2004 o princípio fundamental da presente directiva deve portanto ser o da responsabilização financeira do operador, cuja actividade tenha causado danos ambientais ou a ameaça iminente de tais danos, a fim de induzir os operadores a tomarem medidas e a desenvolverem práticas por forma a reduzir os riscos de danos ambientais.

Segundo a linha de pensamento de Maria Alexandra Aragão, o fim do Princípio em análise é o de fazer os poluidores pagar, em conformidade com regras de justiça e eficácia e evitando distorções de mercado. Por sua vez, a internalização de custos que está subjacente, pois é de conhecimento que as funções de prevenção e reparação podem ser levadas a cabo pelo Estado, contudo, prefere-se que seja o agente poluidor a fazê-lo, só sendo a outra entidade competente chamada quando o infractor não conseguir suportar os seus custos, marcando-se aqui o último recurso. O dever de prevenção e reparação surge a título imediato, não necessitando de ser exigido, nasce por si, após a consumação da infracção.

A Recomendação do Conselho 75/436 de 3 de Março prevê que o poluidor é aquele que degrada directa ou indirectamente o ambiente, ou cria condições que conduzam à sua degradação. A nível nacional o poluidor é o operador de uma actividade ocupacional. O conceito “actividade ocupacional”, utilizado recorrentemente no RJRA, artigos 12º e 13º, bem como “actividade lesiva” (art. 3º nº1 e art.6º) ou “actividade económica” (art. 2º, 7º) subsumem-se todas a um denominador comum, a uma actividade de natureza não recreativa.

Quanto ao que o poluidor deve pagar, recai sobre as medidas necessárias para evitar a poluição ou reduzi-la, a fim de respeitar as normas.

O Poluidor concretiza a denominação do princípio ao pagar de uma das seguintes formas: ou suportando os custos das medidas que adopte para reparar os danos ou evitá-los, caso seja essa a situação; suportando os custos das medidas tomadas, não por ele, mas por Estado ou terceiro; ou suportando as garantias financeiras constituídas para reforço da responsabilidade ambiental., podendo como outra opção, pagar a taxa de 1% sobre cada garantia financeira dada para reforço da responsabilidade ambiental.

Como exemplo da aplicação do princípio, temos o artigo 24º nº1 c) da Lei de Bases do Ambiente, que nos fala de resíduos e efluentes. O artigo 6º do DL 293/97 de 9 de Setembro diz que “custos de gestão dos resíduos serão suportados pelo respectivo produtor”.

Esta norma afirma que a colocação de resíduos em aterros dá-se por força do pagamento de uma taxa, numa vertente de suportar os custos por essa actividade, bem como estimular a sua redução








V - Responsabilidade Objectiva



De origem romana, e apesar de pouco empregada naqueles tempos, a responsabilidade objectiva ganhou corpo através da escola francesa, principalmente  a partir do século XIX. Nos casos específicos em que a sociedade exige uma reparação dos prejuízos, mesmo não havendo culpa, aplica-se a responsabilidade objectiva, ou seja, a obrigação de reparar o dano não está vinculado a um comportamento culposo do agente.

A imputação do risco funda-se na concepção de que cada pessoa singular ou colectiva, pública ou privada, deve responder pelos riscos e pelos danos resultantes das actividades de que tira proveito. Tradicionalmente, o nosso ordenamento jurídico adoptou uma concepção restritiva da responsabilidade pelo risco, consagrando, taxativamente a sua admissibilidade apenas nos casos previstos na lei.

Nesta vertente, o agente responde pelos danos a que deu origem, ainda que tenha actuado rigorosamente de acordo com o nível de zelo e de diligência que lhe era exigível, é dispensado o requisito da culpa e funda-se nas actividades consideradas perigosas (listadas no anexo III do mesmo diploma legal). Todos os operadores que desenvolvam alguma destas actividades estão sujeitos à responsabilidade objectiva perante o lesado na sua pessoa e bens. Os restantes operadores com actividades não enunciadas no anexo ficam sujeitos ao regime da responsabilidade subjectiva.

A responsabilidade objectiva é feita independentemente da existência de dolo ou culpa e está regulada no artigo 7º, relativamente à responsabilidade civil, e no artigo 12º no que concerne à responsabilidade administrativa. A maior diferença subjacente a estes dois regimes reside na obrigação do operador de adoptar medidas de prevenção e reparação dos danos ambientais ou ameaças causados (art. 12º), sendo que, no outro caso apenas releva a lesão efectivamente causada ao ofendido, originando a obrigação do operador de reparar os danos dessa ofensa, em contexto de responsabilidade civil, na qual predomina o nexo de causalidade.

No referido Anexo III do RJRA são identificadas actividades, como por exemplo, actividades relativas a operações de gestão de resíduos (nº 2), captações e represamentos de água (nº6), descargas para águas interiores de superfície de substâncias perigosas (nº3), entre outras.










VI - Responsabilidade subjectiva



Por outro lado, no artigo 8º do RJRA encontra-se previsto o regime respeitante à responsabilidade subjectiva a nível civil, e, no 13º, a responsabilidade administrativa. Esta é determinada, essencialmente, por exclusão das actividades enumeradas no anexo III, o que significa que todos os operadores que desenvolvam qualquer actividade ocupacional não prevista no dito anexo estão sujeitos ao regime da responsabilidade subjectiva de responsabilidade ambiental. Como tal, depressa é feita a remissão para os pressupostos exigidos na responsabilidade civil, dos quais faz depender a obrigação de indemnização: facto voluntário do agente, do qual surge um comportamento dominável pela vontade de agir (acção) ou não agir (omissão); a ilicitude, que corresponde à violação de um dever imposto pela ordem jurídica; culpa, dividindo-se em dolo – intenção do agente em praticar o facto – e negligência – não há intenção, mas o comportamento do agente não deixa de ser censurável em virtude de ter omitido diligência a que estava legalmente obrigado; dano, sofridos pelo lesado, enquanto condição essencial da responsabilidade, deverá atender aos danos emergentes e lucros cessantes, bem como danos patrimoniais e não patrimoniais; e, por fim, o nexo de causalidade entre o facto e o dano, sendo que o comportamento tem de ser a causa dos danos sofridos.

Porém, de acordo com o RJRA os pressupostos são alterados, o que se justifica pelas características do dano ambiental relativamente ao dano tradicional. Neste regime, facto considerado provável é tido como verdadeiro, ao abrigo do disposto no artigo 5º, já que a apreciação da prova do nexo de causalidade assenta num critério de verosimilhança e de probabilidade de o facto danoso ser apto a produzir a lesão verificada.

Neste campo, cabe também fazer a destrinça entre o âmbito de aplicação da responsabilidade civil e administrativa. Enquanto a primeira faz a alusão à mera culpa, para além do dolo, a segunda prevê a negligência. Ademais, na responsabilidade civil subjectiva o agressor fica obrigado a reparar os danos resultantes da ofensa, contudo, na responsabilidade administrativa o operador é responsável pela adopçao de medidas de prevenção e reparação dos danos ou ameaças causados.










VII- Dano ambiental





O conceito de dano ambiental é autonomizado no RJRA, no artigo 11º, nº1 al. e), segundo de uma enunciação exemplificativa. Esta designação já sofreu ao longo dos anos várias denominações, tais como “dano ecológico purp”, “dano ecológico propriamente dito” ou “danos causados no/ao ambiente”.

No ordenamento português, existe uma noção ampla de dano ambiental. O artigo 66º. da CRP, entende o direito ao ambiente como um verdadeiro direito fundamental, e nesta perspectiva coloca-se muito bem a questão fundamental do ambiente e da qualidade de vida (artigo 9º. da CRP). O interesse em garantir uma qualidade de vida sadia e equilibrada é bem visível na nossa Constituição. Contudo, doutrina minoritária entende que dano ecológico consiste em qualquer agressão provocada aos bens naturais, como sejam a água, a terra, a luz e o clima, e às relações recíprocas entre eles e que por sua vez a agressão ecológica - ambiental seria a alteração através de condutas omissivas ou activas pela pessoa física de Direito público ou Direito privado a estes mesmos bens. Outros dizem ainda que dano ecológicos correspondem aqueles insusceptíveis de quantificação em valor monetário, ou seja, sem de valor patrimonial, mas antes sim violação de interesses de protecção da natureza. Todavia, a doutrina maioritária assenta na distinção entre os dois tipos de danos, alegando que esta se deve basear na ideia em que a classificação de dano ambiental deve ser atribuida em situações de danos provocados a bens jurídicos concretos através de emissões particulares ou através de um conjunto de emissões emanadas de um conjunto de fontes emissoras, ao passo que ao dano ecológico devem corresponder as lesões intensas causadas ao sistema ecológico natural sem que tenham sido violados direitos individuais

Citando o Senhor Professor Vasco Pereira da Silva, “a adopção de uma noção ampla objectiva de “dano ambiental” põe em causa a distinção doutrinária entre “dano ambiental” e ”dano ecológico”, alargando o primeiro de modo a abarcar também o segundo”, chegamos à conclusão do quão raro é encontrar apenas um dano ecológico.

O dano ambiental não afecta somente os componentes ambientais, podendo também provocar danos na esfera do direito privado. Tal sucede quando a lesão se consubstancia na componente ambiental, que é, ao mesmo tempo, suporte de um bem objecto de direito privado mas, de igual modo, de direito público, traduzindo-se em lesões no âmbito do património privado de um sujeito e/ou no património colectivo, pertencente ao Estado.

Tomando como exemplo a componente ambiental ar, esta é abrangida por via do artigo 6º, sob a epígrafe poluição de carácter difuso , também referenciada no nº9 do Anexo III, relativamente às instalações industriais que, sujeitas a autorização, ficam consequentemente abrangidas pelo regime da responsabilidade objectiva pela prevenção e reparação de danos ambientais. A grande complexidade de determinação deste dano ambiental reside na prova do nexo de causalidade, designadamente na identificação dos agentes causadores e na sua quantificação em concreto. A componente ar surge por via de associação ou relação de juízo provocado sobre os outros componentes ambientais protegidos. No caso da diminuição da camada de ozono ou do aumento do teor de CO2, pese embora a evidência de consubstanciar um dano ambiental, é muito difícil, senão impossível, estabelecer o nexo de causalidade e identificação dos seus poluidores, uma vez que advêm de uma poluição extremamente disseminada, impossível de relacionar os efeitos ambientais.



Assim, torna-se fulcral a implantação de medidas e critérios destinados à reparação dos danoa ambientais. A Agencia Portuguesa do Ambiente (APA) é a autoridade copetente para efeitos de aplicação do RJRA, estando legitimada para intervir em qualquer momento. Sempre que ocorram danos ambientais, a APA pode, exercer a sua competência, levando a efeito as acções que se encontram previstas no art. 15º nº3, desde Janeiro de 2010. Para tal, são averiguados vários níveis de actuação, consoante se estabeleça uma relação de cooperação ou colaboração com o operador face à situação em concreto. Nesse sentido, as medidas a tomar serão apreciadas à luz da significância do dano, da área envolvente, da ausência de colaboração pelo operador, entre outros factores.

Num primeiro nível, é exigido ao operador que forneça informações suplementares sobre os danos ocorridos. Através da inspecção, é recolhido um inquérito ou qualquer outro meio adequado, com vista à obtenção das informações necessárias para uma análise completa do acidente ao nível técnico, organizativo e de gestão, com a colaboração de outras entidades públicas com atribuições no domínio do ambiente, sempre que necessário. De seguida, são dadas instruções ou exigido ao operador que adopte todas as medidas viáveis para imediatamente controlar, conter, eliminar ou de outra forma gerir os elementos contaminantes pertinentes e quaisquer outros factores danosos, para limitar ou prevenir novos danos ambientais e efeitos adversos para a saúde humana ou novos danos aos serviços. Como necessário, serão, após, dadas intruções de carácter obrigatório ao operador quanto às medidas de reparação necessária.










 VIII - Breve referência à tutela do Ambiente através Direito Penal



A revisão do Código Penal aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/95, de 23 de Setembro, constitui uma oportunidade privilegiada para, no tocante à parte especial, se reverem os comportamentos que devem ser penalmente consagrados. Muito embora o Código revisto apresente um número apreciável de artigos a menos, tal ficou a dever-se basicamente a novas formas de articulação dirigidas a evitar a "prolixidade" que caracterizava "a construção de tipos afins". E a lei de autorização da revisão exemplificava a tal propósito com os crimes contra o património, de perigo comum ou contra o Estado.

No elenco das novas infracções a introduzir mencionaram-se as de "danos contra a conservação da natureza" e a de "poluição", que figurarão contempladas respectivamente nos artigos 278.º e 279.º do diploma.

Os crimes contra o ambiente constituem ilícitos penais novos. E não tanto porque tenham recebido uma formulação dogmática diferente, mas porque se elegeu um bem jurídico novo. Daí que, numa época em que ressoam ainda os ecos da descriminalização como palavra chave da polícia criminal, nos tenhamos que interrogar sobre o porquê desta opção legislativa.

Se for observado o direito anterior à revisão do Código o tomar em atenção o que se passa com alguns códigos estrangeiros, obviamente que subsistem inúmeras disposições em que se protege indirectamente o ambiente. Referir-se-á entre nós todo o conjunto dos crimes de perigo comum previstos antes no artigo 153.º e seguintes do CP, ou as infracções previstas na Lei 19/86 de 19 de Julho, relativas a incêndios florestais, ou do âmbito circunscrito da caça ou pesca. O que porém existe de novidade nos crimes dos artigos 278.º e 279.º do CP é a eleição e protecção do bem jurídico ambiente ou a qualidade do ambiente enquanto tal.

As grandes opções de política criminal são opções de política, com tudo o que isso envolve, e estão ligadas pois, directamente, aos sistemas de Governo das Nações. A traço muito grosso, dir-se-á que uma política criminal que preserve acima de tudo a coesão da comunidade e os seus valores, secundarizando a pessoa enquanto indivíduo, deposita uma confiança grande na repressão, e aposta pois na criminalização dos comportamentos, ou até das personalidades nocivas, bem como no fim retributivo da pena.

No extremo oposto, o modelo "liberal" adopta uma perspectiva humanista com a valorização autónoma e primária do indivíduo como tal, reserva para a pena fins utilitários, e propõe mesmo um recuo do sistema penal repressivo, arvorado em última ratio de qualquer política social. Este modelo "liberal" é o que melhor se casa com o "Estado Democrático e Social de Direito", de que Portugal se reclama.

E assim é possível contar hoje com um novo paradigma do direito penal que melhor se coaduna com o Estado de Direito, para além da ameaça, aplicação e execução da pena não serem pré-ordenadas à compensação da culpa e esta desempenhar o papel de limite inultrapassável da dita pena, o princípio de intervenção mínima, realiza-se através do duplo critério da necessidade e da eficácia ou adequação da intervenção do direito penal. Os interesses em jogo na convivência social, se fundamentais, não admitem comportamentos que os violem. A intolerabilidade de tais comportamentos aponta para a sua criminalização. No entanto, a disponibilidade de alternativas idóneas à superação dos conflitos afastará a intervenção do direito penal.

Acresce que, mesmo estando em causa a protecção de bens jurídicos fundamentais, se não for clara a existência de outros instrumentos jurídicos para os proteger convenientemente, ainda aí o direito criminal deverá abster-se de intervir, se tal intervenção não for profícua. E não o será, sempre que com a criminalização se obtenham resultado muito escassos, ou à custa de sacrifícios sociais desmedidos.

Dentro dos limites relativamente largos, fica um espaço reservado à dinâmica da criminalização e da descentralização através da qual, o legislador vai, afinal, exprimir os anseios de uma certa fase do processo histórico. Na direcção que segue, esse legislador subordina-se aos concretos dados da estrutura social vigente, reflecte opções que poderão ser exclusivamente político-ideológicas, sofre a pressão de grupos sociais zelosos na defesa dos seus interesses e faz-se eco das representações axiológicas vigentes no momento.

O progresso tecnológico originou por seu turno formas sofisticadas e inéditas de atentar contra interesses tradicionais, como sejam a liberdade, a intimidade, o bem estar e a saúde individuais. Houve pois, uma neocriminalização imposta pelo aparecimento de novos meios de cometimento de crimes.

Finalmente, o fenómeno da "democratização do crime" a que não são estranhos, à la longue, os efeitos de teoria como a do "labeling approach". A criminalidade "white collar" é um facto cada vez mais preocupante e parece arredada de vez, ao menos ao nível do discurso, a ideia de que o crime respeita só às camadas mais desfavorecidas ou marginalizadas da sociedade. Fenómenos como o da corrupção em larga escala e da criminalidade económica, de empresa, organizada ou não, exigiram a criação de tipos de crime diferentes.

Neste contexto, uma neo-criminalização na área da protecção do ambiente poderá inscrever-se na necessidade de responder aos desafios do desenvolvimento tecnológico e da criminalidade "white collar".



Os atentados mais gravosos ao ambiente estão hoje qualificados como crimes no Código Penal como referi. Os chamados crimes ecológicos ou ambientais são o crime de danos contra a natureza e o crime de poluição. Sucede porém que a qualificação das condutas aí descritas como criminosas suscita vários problemas, de cuja boa resolução vai depender a eficácia da intervenção do direito penal na

Esta tutela autónoma do ambiente ficou a dever-se à progressiva tomada de consciência pela comunidade da gravidade da degradação ambiental. O facto decisivo de a tutela penal ser possibilitada pela existência de um “modelo constitucional de estado de Direito Ambiental”, tendo o legislador configurado o direito do ambiente como um direito fundamental autónomo e também como direito social e económico que reclama prestações positivas das autoridades.

O bem jurídico ambiente relevante para o direito penal é concebido de forma restritiva por ter como objectivos de protecção os componentes ambientais naturais, a água, o solo, o ar, o som, a fauna, e a flora e as condições ambientais de desenvolvimento destas espécies.

A legitimidade da intervenção penal justifica-se por a Constituição da República Portuguesa ser a lei suprema de um ordenamento jurídico.






Conclusão



O regime da responsabilidade ambiental é justificado no quadro de uma economia desenvolvida e competitiva, com capacidade para cumprir os imperativos legais da legislação ambiental e assumir os custos inerentes aos danos e ameaças iminentes provocados. Do mesmo modo, assume um papel fundamental na sociedade contemporânea, mais exigente no direito ao ambiente sadio e ecologicamente equilibrado, do qual depende o bem-estar, a saúde e a qualidade de vida humana. A responsabilidade ambiental dos operadores públicos e privados corresponde ao culminar do precurso prenunciado sobre a evolução so Direito do Ambiente. A primeira correspondeu à consciencialização ambiental, seguida de acções dirigidas à redução de emissões, a par de monotorização ambiental, que constituiu a segunda fase, e, finalmente, a terceira dirigida para a responsabilização sos operadores públicos e privados pelos danos provocados, com a obrigação de suportarem custos inerentes.

Cabe assim aferir que todo o ser humano, dotado de valores, deverá actuar em sociedade com as devidas diligências, não só a pensar nos próprios, como nos seus, no futuro de gerações que se avizinham.






X – Bibliografia



·         Carla Amado Gomes, Textos Dispersos de Direito do Ambiente, II Volume, AAFDL 2008, Lisboa

·         Vasco Pereira da Silva, “Verdes são também os direitos do Homem; Responsabilidade Administrativa em Matéria de Ambiente”, Principia, Cascais, 2000.

·         Vasco Pereira da Silva, “Verde Cor de Direito; Lições de Direito do Ambiente, Almedina, 2001

·         Sofia Sá, Responsabilidade Ambiental – Operadores Públicos e Privados, Vida Económica, 2011, Lisboa

·         Cátia M. Cebola, Jorge Barros Mendes, Marisa C. Ferrão e Susana Almeida, Direito do Urbanismo e do Ambiente – Estudos compilados, Quid Juris, 2010, Lisboa

·         Bruno Albergaria, Direito ambiental e a responsabilidade civil das empresas, Editora Fórum, 2005, Belo Horizonte

·         Anderson Furlan, Direito do Ambiente, Editora Forense 201º

·         Regime Juridico dos danos ambientais, Decreto-Lei nº147/2008 de 29 de Julho

·         Constituição da República Portuguesa



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